Em 1969, Israel lançou uma iniciativa secreta para incentivar a emigração voluntária de palestinos de Gaza para o Paraguai, visando o reassentamento de 60.000 indivíduos como uma estratégia demográfica após a Guerra dos Seis Dias de 1967. O plano foi formalizado pela Decisão Shin.Taf/24 em 29 de maio de 1969, envolvendo altos funcionários, incluindo a primeira-ministra Golda Meir e o chefe do Mossad, Zvi Zamir, e prometia aos palestinos uma nova vida no exterior com incentivos financeiros, terras, trabalho e apoio à integração cultural. No entanto, apenas 30 indivíduos foram realocados antes que o plano colapsasse em 1970, após um incidente violento que revelou seus fracassos. Para os palestinos envolvidos, a experiência foi marcada por uma profunda decepção: prometidos um futuro no Brasil, eles foram, em vez disso, abandonados no Paraguai, sem os recursos ou apoio prometidos. Este artigo centra-se em seus relatos para destacar o custo humano dessa política malfadada.
A iniciativa, mediada pelo Mossad e coordenada pela agência de viagens israelense Patra, de propriedade de Gad Greiver, oferecia aos palestinos em Gaza um pacote atraente: um pagamento único de US$ 100 (cerca de US$ 750 hoje), despesas de viagem totalmente cobertas, residência imediata no país anfitrião, um caminho para a cidadania em cinco anos, terras agrícolas, oportunidades de emprego e apoio à integração cultural, incluindo assistência linguística. O Paraguai, sob o ditador Alfredo Stroessner, concordou em receber os emigrantes por um pagamento de US$ 33 por pessoa, com um adiantamento de US$ 350.000 para os primeiros 10.000, imaginando-os como mão de obra para o desenvolvimento agrícola.
Para os palestinos, as promessas eram particularmente atraentes. Gaza, em 1969, enfrentava estagnação econômica e as pressões da ocupação israelense, tornando a perspectiva de um novo começo no Brasil — um país frequentemente destacado nos esforços de recrutamento da Patra — altamente atraente. Agentes comercializaram o programa como uma realocação estruturada com empregos, lotes de terra e assistência para aprender português ou se integrar culturalmente, direcionando-se a indivíduos desesperados por estabilidade. A promessa do Brasil, com sua diáspora árabe estabelecida e oportunidades econômicas, contrastava fortemente com a realidade que os aguardava.
Os relatos dos palestinos revelam uma traição marcante. Uma narrativa vívida vem de Mahmoud, um palestino recrutado pela Patra com garantias de trabalho e terra no Brasil, completas com apoio para aprender português e se integrar em uma comunidade vibrante. Ele recebeu documentos e uma passagem aérea, apenas para descobrir, ao chegar em Assunção, Paraguai, que havia sido enganado. Não havia Brasil, nem trabalho, nem terra, nem apoio para integração cultural — apenas um pagamento insignificante de US$ 100 e documentos de residência com pouco valor prático. A história de Mahmoud é emblemática do engano enfrentado pelos poucos participantes, que se encontraram abandonados em um país desconhecido sem recursos ou comunidade.
Outros relatos ecoam esse sentimento de abandono. Os 30 palestinos realocados foram forçados a navegar pelo cenário linguístico e cultural do Paraguai — dominado pelo guarani e espanhol — sem o suporte linguístico prometido. As terras agrícolas prometidas nunca se materializaram, e nenhum programa de emprego foi estabelecido. Os participantes sentiram-se “enganados” por deixar Gaza, suas expectativas de uma realocação estruturada foram destruídas pela realidade do isolamento e negligência. A promessa de integração cultural, crucial para a adaptação a uma nova sociedade, estava completamente ausente, deixando os indivíduos por conta própria em um país sem uma diáspora palestina para oferecer apoio. Esse abandono aprofundou seu senso de traição, ao perceberem que eram parte de uma manobra geopolítica, em vez de destinatários de oportunidades genuínas.
O colapso do plano foi acelerado por um incidente dramático em 4 de maio de 1970, na embaixada israelense em Assunção. Dois emigrantes palestinos, Talal al-Dimassi e Khaled Darwish Kassab, atiraram e mataram Edna Peer, uma funcionária da embaixada, em um ato frequentemente rotulado como o primeiro caso de terrorismo palestino no exterior. No entanto, o contexto sugere uma história mais complexa. Os palestinos buscaram assistência na embaixada após um agente prometido do Mossad — responsável por organizar imóveis e oportunidades de trabalho — não aparecer. Quando o embaixador os rejeitou, ignorando seus apelos, sua frustração explodiu em violência.
Esse incidente levanta questões sobre o rótulo de “terrorismo”. As ações dos homens, embora trágicas e injustificáveis, parecem enraizadas na desesperança pelas promessas não cumpridas de terra, trabalho e apoio. Sentindo-se abandonados tanto por Israel quanto pelo Paraguai, seu ataque foi menos um ato planejado de violência política e mais uma reação ao engano e negligência. O tiroteio expôs o plano ao escrutínio internacional, levando a queixas de estados árabes às Nações Unidas e interrompendo a iniciativa. Também destacou a profundidade da desilusão palestina, já que as promessas quebradas alimentaram ressentimento e desespero.
As promessas não cumpridas deixaram um impacto profundo nos palestinos envolvidos:
Esses relatos, embora limitados pela pequena escala do plano, destacam um padrão de exploração. O fracasso do plano decorreu de sua incapacidade de cumprir esses compromissos, deixando os palestinos desamparados e o Paraguai cauteloso quanto a maior envolvimento.
As falhas éticas do plano eram evidentes. Críticos, incluindo defensores palestinos, argumentam que ele beirava o deslocamento forçado, explorando o desespero de Gaza para reduzir a população palestina. O envolvimento do Mossad, que mediou o acordo e cessou a caça a nazistas no Paraguai por volta do mesmo período, aumentou as percepções de manipulação. A confidencialidade do acordo, escondida até o tiroteio de 1970, alimentou acusações de conduta antiética. O Paraguai, temendo reações de nações árabes, rapidamente se distanciou, com Stroessner abandonando o plano após o incidente.
Para os palestinos, a experiência reforçou uma narrativa de deslocamento e confiança traída. A pequena escala do plano — realocando apenas 30 indivíduos — contribuiu pouco para os objetivos demográficos de Israel, mas deixou cicatrizes duradouras nos participantes. O custo humano reflete as consequências de uma política que priorizou a estratégia sobre a humanidade.
O Plano Israel-Paraguai de 1969 permanece uma nota de rodapé no conflito israelo-palestino, mas seu impacto sobre os poucos participantes é profundo. Os relatos palestinos de um futuro prometido no Brasil — completo com terras, trabalho e apoio cultural — apenas para serem abandonados no Paraguai revelam o custo humano de experimentos geopolíticos. O tiroteio na embaixada de 1970, desencadeado pela ausência de um agente prometido do Mossad e pela rejeição do embaixador, reflete o desespero dos traídos, desafiando rótulos simplistas como “terrorismo”.
À medida que discussões sobre propostas de migração semelhantes emergem, essas histórias servem como um alerta. Políticas orientadas por objetivos demográficos devem priorizar transparência e apoio genuíno para evitar repetir os fracassos de 1969. Para os palestinos envolvidos, o plano é um lembrete amargo de promessas não cumpridas, suas vozes um chamado à responsabilidade diante do deslocamento e do engano.